Município de Garruchos, na região das Missões, tem 2.924 moradores e nenhum caso registrado do Covid-19 | Foto: Prefeitura Municipal de Garruchos / Reprodução / CP

Desde o primeiro caso de infecção pelo novo coronavírus no Rio Grande do Sul, registrado em10 de março, em Campo Bom, a população passou a contabilizar a evolução do vírus em todas as regiões do Estado. Quase sete meses depois – com mais de 205 mil casos positivos para a doença, em 495 cidades, e 4,9 mil mortes – apenas dois municípios gaúchos seguem sem casos confirmados para a Covid-19: Cerro Branco e Garruchos. O segredo para manterem-se como zonas livres da doença, que já atingiu 99,6% das cidades gaúchas, envolve uma boa dose de planejamento, organização e conscientização da população.

Com 4,6 mil habitantes, Cerro Branco decidiu adotar medidas preventivas desde o começo da pandemia no Estado. Localizado na região Centro-Serra, a 230 quilômetros da Capital, o município reforçou as ações de conscientização por meio de um carro de som. No município cuja economia é baseada na agricultura, com mais de 70% da população instalada na área rural, o prefeito Jorge Luiz Hoffmann (PDT) decidiu gravar uma mensagem com orientações sobre a importância de distanciamento social e cuidados de higiene.

Hoffmann explica que a ideia de colocar um carro de som para circular pela cidade com a mensagem foi uma sugestão do médico cirurgião Ilceu Carlos Mergen, amigo de longa data. “O veículo passou a circular em março, principalmente no interior do município. E também passamos a veicular a mensagem na rádio comunitária, que teve bastante influência na divulgação”, observa, acrescentando que municípios vizinhos como Novos Cabrais e Candelária tiveram casos confirmados para a Covid-19.

Por conta dos mais de 30 anos de trabalho no posto de saúde, Mergen acabou gravando a mensagem que ainda roda pela cidade. “Ele é um médico aposentado, mas tem respaldo da população”, frisa.

Mais do que alertar a população para a adoção de medidas preventivas, a prefeitura reforçou cuidados com idosos e decidiu suspender as aulas até o fim do ano. “O segredo (para para não ter nenhum caso) é que a população está consciente e ajudou. Não é o prefeito, nem um, nem dois, é principalmente a área da saúde, que não mediu esforços para que chegássemos a esse ponto”, destaca.

A cidade conta ainda com um comitê para enfrentamento à Covid-19. Uma equipe com agentes de saúde visita moradores da área rural e promove ações de conscientização. “No começo tivemos bastante dificuldade no comércio”, reconhece.

Há 43 anos no município, Mergen afirma que a prefeitura decidiu implementar medidas drásticas logo que o vírus começou a se disseminar no Estado, com fechamento de bares e restaurantes. A partir disso, se reuniu com o prefeito para elaborar um plano para ajudar a conscientizar a população sobre a necessidade de cumprir protocolos sanitários e atualizar o cenário da Covid-19 na cidade.

“Aglomeração aqui é difícil, mas destacamos a importância da questão higiene, do isolamento vertical, principalmente de pessoas de alto risco. Os idosos aqui se reúnem nos botecos para jogar cartas, mas fazem parte do grupo de risco. Procuramos agir nessa questão”, assinala.

Embora ressalte que Cerro Branco é um município pequeno, com a maior parte da população instalada na área rural, o que naturalmente provoca ‘distanciamento’, Mergen reconhece que o fato de ser conhecido ajudou a população a compreender a importância das medidas. “Todos me conhecem e levam um pouco em conta”, salienta.

Para manter a população informada, ele divulga uma espécie de boletim em sua página no Facebook. Na rede social apresenta dados atualizados sobre a doença. “Publico quase semanalmente informações sobre situação em Cerro Branco, no Estado, no país”, frisa. Com 160 casos investigados, a cidade ainda sustenta o título de zona livre da Covid-19.

Com 2.924 moradores, o município de Garruchos, na região das Missões, também implementou medidas drásticas desde o início da pandemia. O prefeito João Carlos Scotto (PP), que tem formação em Medicina da Família, garante que a decisão mais importante foi definir ações e montar equipes para fiscalizar a cidade. Ele garante que o diferencial da cidade – localizada na fronteira com Argentina e mais de 600 quilômetros da Capital – foi assumir que a ‘pandemia é séria’.

“A gente vê o Brasil tratando tudo isso de forma completamente misturada, politizada, e a partir daí se complicou. Focamos exclusivamente na pandemia, com uma equipe que trabalha só com isso”, frisa.

Para dar forma ao plano para evitar a disseminação do vírus, Scotto afirma que ‘copiou’ modelos de protocolos que tiveram resultados positivos, como os adotados por China e Nova Zelândia. “Nos inspiramos naqueles que estavam encarando a pandemia como coisa séria. O Brasil virou politicagem, não conseguimos focar e definir até agora, o que provoca um sacrifício foi muito grande”, avalia.

Dois grupos atuam na parte técnica e de fiscalização. Além de definir o que é essencial e permitido para ingressar na cidade, as equipes fazem uma triagem na entrada do município. “O único hospital referência fica a 90 quilômetros daqui, e o paciente precisa enfrentar 60 quilômetros de estrada de chão”, alerta.

As orientações sobre distanciamento social, cuidados de higiene e uso de máscaras são reforçadas à população desde início da pandemia. “Montamos barreiras de conscientização através dos técnicos e evitamos que pessoas viessem ao município. Conseguimos reduzir as visitas de famílias e ‘cortamos’ o que não era essencial”, destaca.

A presença de pescadores na região também diminuiu por conta das restrições impostas aos visitantes, que são obrigados a cumprir período de observação. Quem pretende ingressar na cidade precisa preencher cadastro com uma série de informações como nome, localidade de onde vem, número de pessoas que teve contato, previsão de estadia, entre outros.

Ao destacar que fechou ‘tudo que não é essencial’ na cidade, Scotto reconhece que houve falhas que precisaram ser corrigidas durante o processo. “As equipes de triagem e de fiscalização são os grandes aliados da população. A partir do momento que tiveram consciência do resultado, da vantagem, os moradores passaram a ser os primeiros a denunciar aglomerações na madrugada”, revela.

Ele alerta que a pandemia não ‘termina’ com a vacina para Covid-19 e destaca os problemas enfrentados pela Europa com o surgimento de novos casos. “O vírus está se modificando. Temos que aprender não na crise de hospital, com gente morrendo de todo lado, com leitos lotados, como foi na Europa”, completa.

Sem concorrer à reeleição, Scotto reflete que é o momento de preparar a população para enfrentar o vírus, mesmo que a cidade não tenha nenhum caso registrado. “Estamos preparados para o primeiro caso confirmado para doença”, garante. Se registrar o primeiro caso de infecção da doença na cidade, o plano da prefeitura prevê cuidados especiais a casa de idosos, que estão adaptadas com leitos. “O objetivo também é tentar reduzir o contágio familiar. As escolas seguem fechadas até a chegada de uma vacina”, reforça.

O prefeito também faz boletins sobre a situação da doença na localidade. “Faço avaliação diária da região, porque posso precisar remover algum paciente, se for estado grave”, conclui.

Fonte: Correio do Povo

 

 

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